26 de abril de 2025
Saúde

Estudo revela metais tóxicos no líquido de cigarros eletrônicos descartáveis

Uma pesquisa do Laboratório de Química Atmosférica (LQA) da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) revelou que cigarros eletrônicos descartáveis, conhecidos como vapes, contêm metais tóxicos em seu líquido antes mesmo de serem utilizados. Os resultados preliminares do estudo, obtidos com exclusividade pela BBC News Brasil, apontam a presença de cobre, estanho, níquel e zinco em níveis “muito acima do esperado para qualquer tipo de material inalado”.

Os pesquisadores Carlos Leonny Fragoso, doutorando em química, e sua orientadora, professora Adriana Gioda, analisaram 15 vapes descartáveis e detectaram contaminação metálica em praticamente todas as amostras. O estudo também identificou a presença de cerca de dez compostos adicionados para realçar o sabor, incluindo substâncias utilizadas como aromatizantes de velas, que podem ser prejudiciais à saúde quando inaladas continuamente.

Riscos associados ao uso de vapes

Os cigarros eletrônicos são dispositivos que funcionam com uma bateria interna, aquecendo o líquido contido em um reservatório e transformando-o em aerossol. Embora anunciados por alguns como alternativas menos prejudiciais ao cigarro convencional, estudos apontam que os vapes também representam riscos significativos à saúde.

Os líquidos dos vapes descartáveis analisados apresentaram “toxicidade significativa” em testes laboratoriais com leveduras e células cardíacas de camundongos, desencadeando estresse oxidativo, um processo ligado a doenças crônicas, incluindo problemas cardiovasculares e respiratórios.

A pesquisa também examinou 14 líquidos de vapes recarregáveis, modalidade em que o líquido e a bateria podem ser substituídos. Neste caso, não foram detectados metais tóxicos em níveis quantificáveis, possivelmente porque o líquido, ao ser vendido separadamente, ainda não teve contato com os circuitos internos do aparelho. No entanto, os pesquisadores alertam que a contaminação pode ocorrer posteriormente, quando o líquido entra em contato com os componentes metálicos durante o uso.

Impactos e preocupação com jovens consumidores

Apesar da proibição da venda de cigarros eletrônicos no Brasil desde 2009, esses dispositivos são amplamente consumidos, especialmente entre os jovens. Não há estatísticas precisas sobre o número de vapes em circulação no país, mas a Receita Federal apreendeu mais de 1,5 milhão de unidades entre outubro e dezembro do ano passado no Porto de Santos.

A pneumologista Margareth Dalcolmo, pesquisadora da Fiocruz e membro da Academia Nacional de Medicina, alerta para os perigos dos cigarros eletrônicos, considerando-os ainda mais prejudiciais que os cigarros convencionais. “Eles geram dependência mais rápida e mais intensa”, afirma. Segundo estudos, a concentração de nicotina nos vapes pode ser cem vezes maior que a de um cigarro comum, com vício podendo se estabelecer em apenas cinco dias.

O consumo de vapes está associado ao aumento do risco de doenças pulmonares, como enfisema e problemas respiratórios crônicos, e pode levar ao desenvolvimento de câncer de pulmão. A Organização Mundial da Saúde (OMS) já reconheceu uma doença pulmonar específica relacionada ao uso desses dispositivos, chamada EVALI (E-cigarette or Vaping product use-Associated Lung Injury). No Brasil, no entanto, não há registros sistemáticos de casos e mortes associados à EVALI.

Debate sobre a regulamentação dos vapes

O estudo reforça os argumentos contrários à regulamentação dos cigarros eletrônicos no Brasil, um tema que atualmente está em discussão no Senado por meio do Projeto de Lei 5008/2023. Dalcolmo critica a proposta, argumentando que a arrecadação de impostos com a regulamentação seria muito inferior aos custos com saúde decorrentes do aumento no consumo dos produtos.

Por outro lado, a Associação Brasileira da Indústria do Fumo (Abifumo) defende a regulamentação como forma de estabelecer padrões para os produtos. Lauro Anhezini, conselheiro da entidade, argumenta que a falta de regulação impede um controle adequado dos dispositivos vendidos no Brasil. “Com normas bem definidas, poderíamos estabelecer limites para a emissão de substâncias tóxicas e regular a temperatura de aquecimento do líquido”, explica.

Empresas como a BAT Brasil (antiga Souza Cruz) e a Philip Morris afirmam que têm metas para substituir os cigarros tradicionais por alternativas consideradas de menor risco, incluindo os cigarros eletrônicos. Segundo Anhezini, a BAT planeja que, até 2035, metade de seu faturamento venha dessas alternativas.

Conclusão

Os achados do estudo da PUC-Rio ressaltam a necessidade de uma discussão aprofundada sobre os impactos dos cigarros eletrônicos na saúde pública. A presença de metais tóxicos nos vapes descartáveis antes mesmo de sua utilização inicial levanta preocupações adicionais sobre os riscos desse produto. Com a crescente popularidade entre os jovens e a falta de regulação no Brasil, especialistas alertam para a importância de medidas mais rigorosas de fiscalização e conscientização sobre os perigos dessa prática.

 

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