23 de agosto de 2025
Economia

Bolsa Família faz 1 em cada 2 famílias deixar força de trabalho, diz estudo

Imagem reprodução
Pesquisa mostra que, a cada duas famílias beneficiadas, uma deixa a força de trabalho; impacto é maior entre homens jovens do Norte e Nordeste

Um estudo do FGV Ibre (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas) revela que a ampliação do valor médio do Bolsa Família para cerca de R$ 670, em 2023, teve um impacto significativo na participação de seus beneficiários no mercado de trabalho. A pesquisa, conduzida pelo economista Daniel Duque, indica que, em média, a cada duas famílias que passaram a receber o benefício, uma deixou a força de trabalho.

O estudo comparou o grupo elegível para receber o programa com aquele que não tem direito ao auxílio. Entre os potencialmente beneficiados, a taxa de participação no mercado de trabalho registrou uma queda de 11%. As chances de estar ocupado e de ter um emprego formal caíram 12% e 13%, respectivamente, com o efeito sendo mais concentrado em homens jovens, com idade entre 14 e 30 anos, particularly nas regiões Norte e Nordeste do país.

De acordo com Daniel Duque, a lógica por trás do fenômeno é econômica. “Evitar um emprego formal que potencialmente torne a família inelegível ao Bolsa Família é uma preocupação geral”, explicou o pesquisador à CNN. Ele destacou que, mesmo com as regras de desligamento gradual do programa (que preveem a perda do benefício de forma progressiva e não imediata), “a percepção de risco sobre a renda segura do Bolsa Família pesa mais em muitos casos do que o apego à renda de um trabalho formal”.

Impactos de Longo Prazo e Perda de Capital Humano

Duque alerta para as consequências de longo prazo dessa decisão de postergar a entrada no mercado de trabalho. “O primeiro emprego dos jovens é uma das experiências mais importantes para a trajetória de renda ao longo da vida”, afirmou. O adiamento reduz o aprendizado de habilidades socioemocionais, disciplina e experiência prática, impactando negativamente a formação do capital humano.

O economista citou evidências internacionais que mostram que atrasar a entrada em um emprego formal pode reduzir a produtividade e os salários futuros. “Temos evidências de que adiar um ano o primeiro emprego formal tem impacto quase tão alto quanto perder um ano de escolaridade. No longo prazo, isso pode reduzir a renda em cerca de 10%”, detalhou.

Benefício Equipara Salários em Regiões mais Pobres

A razão para o impacto mais acentuado nas regiões Norte e Nordeste, segundo Duque, está no valor do benefício em relação aos salários locais. “A decisão de trabalhar ou não depende do quanto se pode ganhar no mercado e fora dele. O ‘ticket’ do programa aumentou bastante, especialmente nos lugares onde os salários são mais baixos, como nessas regiões. Lá, o benefício quase iguala a remuneração de mercado. São esses jovens que mais saem do trabalho formal”, explicou.

Propostas para Mitigar o Efeito

Como solução, o pesquisador da FGV sugere uma revisão no desenho do programa. Reduzir os valores para alguns públicos poderia evitar que um “jovem sem perspectiva de estudo não evite o mercado de trabalho”. Os recursos economizados, segundo ele, “poderiam reforçar transferências para mães com filhos pequenos ou jovens que apenas deixaram a escola por necessidade de complementar a renda”.

A principal proposta de Duque é integrar o Bolsa Família a políticas públicas de educação e qualificação profissional. “Não vejo por que não usar o Bolsa Família para garantir alguma renda para o estudante continuar sua etapa de ensino, inclusive no técnico. A integração com políticas ativas de emprego e qualificação pode reduzir os efeitos adversos sobre o mercado de trabalho”, defendeu. Ele citou como exemplo a expansão de programas como o Pé-de-Meia, que incentiva a conclusão do ensino médio e o acesso ao nível superior.

A pesquisa conclui que, embora a rede de proteção social seja fundamental, é preciso equilibrar o apoio à renda imediata com incentivos que não comprometam a inserção produtiva e a construção de carreira das novas gerações.

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