A Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (LBI – Lei nº 13.146/2015) completou uma década no último dia 6 de julho, consolidando-se como um marco na garantia de direitos e na promoção da inclusão social. Especialistas destacam avanços significativos, mas apontam que a efetiva aplicação da norma ainda enfrenta obstáculos, como o capacitismo e a falta de acessibilidade.
Baseada na Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência da ONU, a LBI vai além da obrigatoriedade de contratação prevista na Lei de Cotas (Lei 8.213/1991), estabelecendo diretrizes para acessibilidade no ambiente de trabalho e tipificando como crime a discriminação por deficiência.
Modelo baseado em direitos humanos
Liliane Gonçalves Bernardes, pesquisadora do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), explica que a LBI adota um conceito mais amplo de deficiência, considerando não apenas as limitações físicas ou mentais, mas também as barreiras sociais que impedem a plena inclusão.
“A lei prevê adaptações razoáveis no trabalho, como mediação profissional e tecnologias assistivas, além de criminalizar práticas discriminatórias, como demissões injustificadas ou recusa de promoção”, afirma. “No entanto, o preconceito ainda leva muitos empregadores a subestimarem a capacidade desses profissionais.”
Empregabilidade em crescimento, mas desigual
Dados do Ministério do Trabalho mostram que, entre 2009 e 2021, as contratações de pessoas com deficiência cresceram 78,44%, ante 18,26% no mercado formal. Em 2024, mais de 27 mil trabalhadores foram incluídos via fiscalização. Minas Gerais se destaca, com 60% das vagas reservadas preenchidas – acima da média nacional (57,8%).
Patrícia Siqueira, auditora-fiscal do Trabalho, ressalta a necessidade de ampliar a fiscalização e combater estereótipos. “Faltam auditores para cobrir as 44 mil empresas sujeitas à cota. Mas o maior desafio é cultural: afastar a ideia de que pessoas com deficiência são menos produtivas”, diz.
Histórias de inclusão e desafios cotidianos
Lidiane Leal, 40 anos, recepcionista em Belo Horizonte, entrou no mercado por um programa de aprendizagem após enfrentar dificuldades. Nascida sem as pernas e o braço direito, ela celebra a acessibilidade em sua empresa, mas critica a falta de adaptação no transporte público.
“Minha empresa tem banheiro adaptado e portas largas, mas meu trajeto até o trabalho ainda é um obstáculo”, relata.
Desafios estruturais
A taxa de ocupação de pessoas com deficiência (26,6% em 2022) ainda está muito abaixo da média geral (60,7%), segundo o IBGE. Para Liliane Bernardes, o capitalismo e a busca por lucro exacerbam a exclusão. “Muitas empresas contratam apenas pessoas com deficiências leves, que exigem menos adaptações”, observa.
Fernanda Naves, do Ministério Público do Trabalho, enfatiza a urgência de combater barreiras atitudinais. “O maior desafio é mudar a cultura que enxerga a deficiência como sinônimo de incapacidade”, afirma.
Caminhos para avançar
Especialistas defendem mais investimentos em:
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Fiscalização para garantir o cumprimento das cotas;
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Capacitação profissional e políticas de qualificação;
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Acessibilidade em espaços públicos e privados;
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Campanhas contra o capacitismo.
Enquanto a LBI celebra uma década, sua plena implementação segue como uma meta a ser alcançada – não apenas por lei, mas por uma transformação social.