Estudo da Global Witness usou perfis falsos de crianças de 13 anos e encontrou vídeos sexualmente explícitos sendo sugeridos pelo algoritmo da plataforma. Empresa diz estar comprometida com a segurança.
GOIÂNIA – Um relatório investigativo da organização de direitos humanos Global Witness acusa o TikTok de recomendar sistematicamente pornografia e conteúdo sexualmente explícito para usuários cadastrados como crianças de 13 anos. A denúncia persiste mesmo com as configurações de segurança máxima ativadas, revelando uma falha grave no sistema de proteção infantil de uma das redes sociais mais populares do Brasil.
De acordo com a investigação, pesquisadores criaram quatro perfis falsos entre julho e agosto deste ano, informando a idade de 13 anos. Eles ativaram o “Modo Restrito”, ferramenta que, segundo o TikTok, deveria bloquear “conteúdo sexualmente sugestivo”. Apesar disso, o algoritmo da rede social sugeriu, espontaneamente na seção “você pode gostar”, termos de busca abertamente sexuais.
As sugestões levaram a um fluxo de vídeos inapropriados, incluindo simulações de masturbação, exibição de seios e roupas íntimas em locais públicos. Em casos mais extremos, o conteúdo incluía cenas explícitas de pornografia com penetração, embutidas em vídeos aparentemente comuns para burlar a moderação.
“Grande Choque” e Falha do Sistema
Em entrevista à BBC, Ava Lee, representante da Global Witness, classificou as descobertas como um “grande choque”. “O TikTok não está apenas falhando em impedir que crianças acessem conteúdo inapropriado — ele está sugerindo isso a elas assim que criam uma conta”, afirmou Lee.
A organização já havia alertado a empresa sobre o problema em abril. O TikTok afirmou ter tomado “medidas imediatas”, mas uma nova checagem feita pela Global Witness no final de julho e agosto mostrou que as recomendações de conteúdo sexual persistiam.
Em nota, o TikTok disse estar “totalmente comprometido a fornecer experiências seguras e adequadas à idade” e afirmou ter mais de 50 recursos para proteger adolescentes. A empresa também declarou que remove 9 em cada 10 vídeos inadequados antes mesmo de serem visualizados e que, após o alerta, tomou medidas para remover o conteúdo violador e melhorar o sistema de sugestões.
Contexto Global e Pressão Regulatória
O caso ocorre em um momento de crescente pressão regulatória sobre as grandes plataformas de tecnologia. No Reino Unido, novos códigos de segurança online entraram em vigor em julho, obrigando plataformas a adotarem controles de idade “altamente eficazes” e a ajustarem seus algoritmos para proteger crianças. O descumprimento pode resultar em multas bilionárias e até em prisão de executivos.
Além disso, um processo do estado americano de Utah acusa o TikTok de ter ignorado a exploração de crianças em transmissões ao vivo porque “lucrou significativamente” com a prática. A empresa nega as acusações.
Panorama no Brasil
No Brasil, onde o TikTok possui cerca de 100 milhões de usuários, a regulação também avança. Em setembro, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva sancionou o Estatuto Digital da Criança e do Adolescente (ECA Digital). Na ocasião, o presidente criticou a autorregulação das empresas: “Esse equívoco já custou a vida de várias crianças e adolescentes”.
A nova lei estabelece a responsabilidade das plataformas em proteger os menores de 18 anos de conteúdos prejudiciais, cabendo à Agência Nacional de Proteção de Dados (ANPD) a fiscalização.
A revelação da Global Witness levanta questões urgentes sobre a eficácia real das ferramentas de segurança oferecidas pelas redes sociais e a necessidade de uma fiscalização rigorosa para garantir que os direitos das crianças sejam, de fato, respeitados no ambiente digital.